Tempo e silêncio...
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É baloiçar entre o sonho e a realidade,
Entre ser forte e feliz, intensamente da vida aprendiz!
“Dá-me a tua mão.
Deixa que a minha solidão
prolongue mais a tua
– Para aqui os dois de mãos dadas
nas noites estreladas,
a ver os fantasmas a dançar na lua.
Dá-me a tua mão, companheira,
até o Abismo da Ternura Derradeira.”
José Gomes Ferreira
Quando o confinamento teve início - para mim, no dia 12 de março - criei a ilusão de que não só a coisa apenas duraria algumas poucas semanas, como teria tempo para fazer um monte de coisas que queria fazer e tenho procrastinado por não ter tempo, outras que habitualmente não faço e outras que deixei de fazer...
Pensei que ia voltar a fazer exercício físico, que conseguiria concretizar muitos dos meus projetos de agulhas, que teria tempo para ler as montanhas de livros que estão nas prateleiras à espera de vez, de passear com a minha cadela, de fazer experiências com desenho, de criar mais... até regressar com mais regularidade a este cantinho.
Tudo não passou de um filme que concebi na minha cabeça!
Tenho lido algumas coisas, mas menos do que gostava... não tenho pegado na máquina fotográfica... de que tenho saudades.
Hoje percebi que não tenho dado atenção a este(s) espaço(s)...
Acabei por passar tantas horas em frente ao computador que a energia se esgotava e não dava para mais nada que não fosse o trabalho.
De vez em quando era acometida pela determinação de "amanhã vai ser diferente", mas chegava ao fim do dia com os olhos “em bico”, a cabeça “oca” e o rabo quadrado, que a tal determinação ia para o mesmo lugar de onde tinha saído sem que se tivesse movido de lugar.
Queixo-me? Sim e não!
Afinal não fiquei sem trabalho e consegui gerir a minha atividade sem grandes sobressaltos e/ou dificuldades.
Abdiquei de algumas coisas que me eram queridas, é verdade, mas não o suficiente para entrar em desespero. Tenho o privilégio de ter outras que as substituíram e, ainda, de ter mantido outras que prezo ainda mais.
Há dias em que penso que era bom trabalhar sempre em modo remoto, mas rapidamente afugento esses pensamentos. É muito desgastante e parece que a nossa vida é apenas o trabalho e o trabalho é a nossa vida: é difícil separar os dois e fazer a separação que se conseguia com a deslocação até ao local de trabalho. Tenho saudades do contacto com os colegas, das conversas...
E se acredito que vai ficar tudo bem?
Não, não acredito. Pelo menos nos próximos tempos.
Vai ficar bem, aos poucos - isso sim, acredito, mas não é já... Lá para 2021!
... o ano que, decididamente, mais me marcou nos últimos tempos.
Não deixo de pensar os anos a contar pelos períodos letivos, talvez pelo facto de o meu aniversário ser em Setembro, quando as aulas começam, ou por nessa altura se iniciar um novo ciclo na minha atividade profissional,
E porque é que este 2019/2020 foi assim tão marcante?
Por várias razões...
Foi marcado, sem sombra de dúvida, por desafios gigantes originados pelo maldito bicho que nos “veio visitar” e acabou por ficar por aí... (mas que graças a Deus tenho conseguido manter longe do meu meio).
Já o ano letivo ia em modo up and running quando começaram as dificuldades... Houve dias maus. Houve desilusões. Houve lágrimas de exaustão, desespero e tristeza. Houve pausas. Depois vieram os reinícios. Houve sorrisos, sonoras gargalhadas e felicidade. Houve surpresas. Tudo isto envolto em palavras - muitas palavras!
Houve momentos em que hesitei, duvidei das minhas escolhas...
Tive receio. Senti-me como que a pisar um palco pela primeira vez, com uma plateia pequena que te julga de alto a baixo, mede as tuas palavras, estuda os teus gestos, ouve - quase sempre - os teus erros e não te poupa a críticas corrosivas.
Embora tenha mudado de “lado da barricada”, lembro-me bem do que era ser aluna, mas também me lembro da primeira vez que pisei uma sala de aula, pouco mais velha que os alunos e nenhuma experiência.
Mas encarei mais esta prova... acolhi o desafio! Não digo não a um bom desafio!
A verdade é que não há licenciaturas que nos preparem para tudo o que encontramos diariamente numa sala de aula, mas mais de vinte e cinco anos a viver diariamente nesses espaços, acrescidos de mais de quinze a dar explicações, para alguma coisa me serviu o que fui vivenciando. E não foi pouco!
A meio do ano e de forma inesperada viemos todos para casa. Contudo, não foi por isso que o ritmo abrandou... Os primeiros quinze dias foram de desnorteio, desequilíbrio e dúvida. Confesso que, ingenuamente, pensei que este recolhimento durasse apenas algumas semanas. Só que não!
As aulas começaram a ser feitas a partir de casa. O cansaço foi levado, muitas vezes, até à exaustão.
Houve dias em que me sentava ao computador às 6 da manhã e me levantava às 8 da noite.
Houve dias em que já não tinha posição frente ao ecrã, em que o corpo todo doía.
Houve dias em que me deu vontade de “ficar sem internet”.
Houve dias em que os óculos já não davam e quase tive de colocar um segundo par de óculos em cima dos meus.
A juntar a tudo isto, uma vida que não parou e que se mudou de armas e bagagens para dentro das quatro paredes de casa.
Não sei como será em Setembro. Setembro é sempre tempo de mudanças.
Sei que tenho saudades dos meus miúdos: de lhes abrir os olhos e torcer o nariz, de rir com eles, de lhes “dar conselhos”, de ser confidente, de efetivar cada um dos seus sucessos presencialmente.
Mas sei que os meus alunos, se tiverem vontade de aprender, não precisam de estar fisicamente ao pé de mim... Podemos continuar a promover a aprendizagem, mesmo à distância, pois a semente foi lançada e o trabalho que foi desenvolvido individualmente com cada um deles pode continuar. Continuo e continuarei a dar-lhes a cana para que aprendam a pescar.
Só darei por terminado o ano depois de todos os relatórios concluídos e ainda tenho um para acabar!
Deixo aqui o meu BEM HAJA a todos os que permaneceram comigo nestes meses tão díspares quanto difíceis.
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